Ego, descontentamento, medo e ansiedade – livro O Salto de Pema Chödrön

Os ensinamentos budistas dizem que a raiz de nosso descontentamento é nossa personalidade autocentrada e o medo de concentrar nossa atenção no momento presente.

Facilmente, podemos nos transformar de pessoas abertas e receptivas — um sentimento vivo e alerta — em pessoas introvertidas. Mais uma vez, sentimos desconforto e procuramos um alívio rápido, que nunca atinge a raiz do problema. Somos iguais a um avestruz enfiando a cabeça na areia com a esperança de encontrar conforto. Essa fuga de tudo que é desagradável, esse ciclo contínuo de evitar o presente é uma reação egoísta, um apego exagerado a si mesmo, ou ao ego. Uma das metáforas para se referir ao ego é um casulo. Ficamos dentro de nosso casulo porque temos medo, o medo de nossos sentimentos e das reações que a vida vai provocar. Tememos o que pode nos acontecer. Mas se essa estratégia de esquivar-se funcionasse, Buda não teria precisado ensinar nada, porque nossas tentativas de fugir da dor, as quais todos os seres humanos instintivamente recorrem, teriam resultado em segurança, felicidade e conforto, e não existiriam problemas. Porém, como Buda observou, a autoabsorção, essa tentativa de encontrar zonas de segurança, gera um terrível sofrimento. Ela nos debilita, o mundo torna-se mais aterrador, e nossos pensamentos e emoções passam a ser cada vez mais ameaçadores.

Existem muitas abordagens para discutir o ego, mas, na essência, é o que mencionamos. É a experiência de nunca estar presente. Existe uma tendência arraigada, quase uma compulsão, para desviar a atenção, mesmo quando não estamos conscientemente nos sentindo desconfortáveis. Todas as pessoas sentem-se um pouco ansiosas. Há um pano de fundo de nervosismo, tédio e inquietude. Como relatei, durante o período do meu retiro, quando não havia quase distrações, mesmo assim vivenciei esse profundo desconforto. Segundo a explicação budista, sentimos essa sensação desagradável, porque estamos sempre tentando ter uma estrutura firme e quase nunca conseguimos.

Achamos que encarar nossos demônios trará à lembrança algum acontecimento traumático ou a descoberta de que não temos nenhum valor. Mas, ao contrário, é justamente enfrentando essa sensação desconfortável e inquietante de não ter um lugar para fugir que descobriremos — imagine o quê? — que sobrevivemos e não iremos desmoronar, sentimos um profundo alívio e uma sensação de liberdade.

Do livro O Salto de Pema Chödrön

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