O que você diria a alguém que acha a meditação sentada dolorosa, difícil e que luta para praticar

Revista: O que você diria a alguém que acha a meditação sentada dolorosa, difícil e que luta para praticar?

Eu diria para parar.

Revista: Verdade?

Thich Nhat Hanh: Sim, sim. Se você não acha agradável, então não pratique meditação sentada. Você precisa aprender o espírito correto do sentar. Se você tiver que se esforçar muito ao sentar, ficará tenso e isso produzirá dor em todo o corpo. Sentar deve ser algo agradável. Quando você liga a TV na sala da sua casa, pode ficar lá horas a fio, sem sofrer. Mas, ao sentar para meditar, você sofre. Por quê? Porque você precisa lutar. Você quer ter êxito na meditação, então acaba brigando. Ao assistir TV, você não luta. É preciso aprender a sentar sem brigar. Se você souber se sentar dessa forma, a meditação será muito agradável.

Em uma das visitas de Nelson Mandela à França, um jornalista lhe perguntou o que ele mais gostava de fazer. Ele respondeu que, por estar sempre ocupado, o que ele mais gostava de fazer era simplesmente sentar e não fazer nada. Porque sentar e não fazer nada é um prazer – restaura as energias. É por isso que o Buda fala de sentar-se em uma flor de lótus. Quando você se senta para meditar, deve se sentir leve, cheio de vida, livre. E, se não sentir isso, a meditação sentada se tornará  um trabalho forçado.

Às vezes não dormimos o suficiente ou estamos resfriados, algo assim. Neste caso, talvez a meditação sentada não seja tão agradável como você gostaria. Mas se você estiver normal, é sempre possível sentir o prazer de sentar. O problema não é sentar ou não sentar, mas como sentar. Como sentar para que você possa se beneficiar ao máximo – caso contrário, estará perdendo tempo.

Revista: Você enfatiza muito o “desfrutar” – desfrutar da respiração, da meditação sentada, do caminhar, da vida como um todo – você destaca isso muito mais do que outros mestres budistas.

Thich Nhat Hanh: Nos ensinamentos do Buda, a tranqüilidade e a alegria são elementos de iluminação. Já há muito sofrimento na vida. Por que sofrer ainda mais ao praticar o Budismo? Você pratica o Budismo para sofrer menos, certo?

O Buda é uma pessoa feliz. Ao se sentar, o Buda senta-se feliz. Ao caminhar, o Buda caminha feliz. Por que vou querer fazer diferente do Buda? Talvez as pessoas sintam medo do que os outros possam dizer: “Você não é um praticante sério. Você sorri, você ri, você se diverte. Para praticar com seriedade você precisa ser severo, ficar muito sério.” Talvez muita gente que queira receber mais doações aja dessa forma – para dar a impressão de que pratica mais seriamente do que  outros.

Pense como seria passar uma noite inteira meditando. Você não tem permissão para descansar e acha que isso é prática intensiva, mas sofre a noite inteira e toma café para conseguir ficar acordado. Isso não faz sentido. É a qualidade da meditação sentada que poderá ajudá-lo a se transformar, e não ficar sentado muito tempo e sofrendo com isso. A meditação sentada e caminhando foram feitas para serem desfrutadas e para nos permitirem olhar profundamente e desenvolver insights. Esses insights poderão nos libertar do medo, da raiva e do desespero.

Revista: Gostei muito da meditação caminhando ao ar livre que fizemos neste retiro.

Thich Nhat Hanh: Em geral, na tradição budista, você se senta, depois se levanta, caminha lentamente na sala de meditação e depois se senta de novo. Não fazemos assim aqui. Em vez disso, caminhamos ao ar livre. Essa prática ajuda muito, pois você pode aplicá-la na vida diária. Você caminha normalmente – não excessivamente devagar – assim as pessoas nem percebem que você está praticando e vêem isso como algo normal. E, ao voltar para casa, ou ao andar do estacionamento para o escritório, você pode desfrutar desse caminhar também.

A base da prática consiste em gostar do que você está fazendo – gostar de caminhar, de sentar, de se alimentar e tomar banho. É possível desfrutar de tudo isso, mas nossa sociedade está organizada de tal forma que não temos tempo para desfrutar. Temos que fazer tudo rápido demais.

Trecho de entrevista com Thich Nhat Hanh:

(Entrevista exclusiva feita por Andrea Miller para Revista Shambhala Sun – janeiro de 2012)

(Tradução: Denise Kato)

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