Trabalhando com culpa na meditação e atenção plena – Godwin Samararatne

Participante do retiro: Você disse que algumas coisas erradas podem ter sido feitas no passado e podemos não ter perdoado as pessoas ou a nós mesmos e muitas vezes nós suprimimos essas coisas no nosso coração. Quando isso acontece, como posso saber se eu suprimi essas coisas do passado e preciso trazê-las à tona para curá-las?

Godwin: Muito bom. Vamos pegar uma situação prática em que uma ferida foi criada em relação ao que você fez para outra pessoa; você agiu de forma incorreta e agora sofre por conta da culpa. O primeiro ponto é perceber como a ferida foi criada em primeiro lugar. Então, quando você investiga essa pergunta você percebe que a ferida foi criada por sua ideia: “Eu deveria ter me comportado de tal maneira”. Você percebe que o problema está em seu modelo de como você deveria ter se comportado. É útil entender esse processo por que isso pode nos ajudar a curar a ferida. Este é o primeiro ponto.

O segundo ponto é perceber que somos ainda humanos, somos ainda imperfeitos e, portanto, como eu tenho dito muito frequentemente, precisamos aprender a perdoar nossa humanidade, perdoar nossas imperfeições.

Outra sugestão é perceber que essas coisas aconteceram no passado. Eu não posso mudar o passado, então por que estou agarrado em alguma coisa que aconteceu no passado?

O último ponto – espero que eu possa comunicar isto – é que carregamos as feridas em nossa memória. E como elas estão relacionados com memórias, quanto mais tentamos esquecê-las mais elas vêm. Nós não temos controle sobre nossa memória. O controle que temos não é em relação à própria memória, mas como reagimos à ela. É aí onde a meditação entra. Este é o momento que nós podemos trabalhar com ela em termos práticos. Então, quando a memória vem em relação ao que você tem feito, o que você pode observar é a sua reação à memória: a culpa.

Agora, isto é onde a conscientização é relevante: com a conscientização aprendemos que há culpa, e como também temos praticado, aprendemos a dizer OK a essa culpa, aprendemos a nos sentir amigáveis com essa culpa, apenas permitir a culpa se manifeste. Então, depois de algum tempo, você pode se lembrar desse incidente novamente e, novamente a culpa virá, então novamente criamos espaço para que a culpa esteja lá. Também pode ser interessante, às vezes, trazer deliberada e conscientemente a memória e ver como estamos nos relacionando com ela. Então, um dia, você tem a experiência, a memória vem, mas não há nenhuma culpa, e quando isso acontece ela mostra que a ferida está curada. Em seguida, a memória pode vir, mas a emoção correspondente não estará lá. Podemos até deliberada e conscientemente trazer a memória, e a emoção correspondente não estará lá.

Uma última sugestão é compreender que segurar essas feridas é algo muito auto-destrutivo. Então, essas são maneiras e meios de curar tais feridas. Seja culpa, seja tristeza, seja ódio, as ferramentas são as mesmas.

Trecho de O Caminho Gentil da Meditação de Godwin Samararatne: Link https://nalanda.org.br/o-caminho-gentil-da-meditacao