Trabalhando com a raiva na meditação e atenção plena – Godwin Samararatne

Esse livro online de Godwin Samararatne foi para mim uma excelente surpresa pois ele ensina com uma clareza e humildade incrível. Cada pequeno trecho é um luz em muitas dúvidas que tinha. Espero que essa luz brilhe sobre todos também. link: https://nalanda.org.br/o-caminho-gentil-da-meditacao

Participante do retiro: tenho dificuldade em praticar a amorosidade no momento da raiva. Como o senhor disse, quando eu tenho uma mente odiosa é melhor não tomar uma decisão e nem mesmo dizer uma só palavra. Meu problema é que, no meu escritório, quando alguns dos meus funcionários fazem algo errado, eu imediatamente fico com raiva e digo algo a eles. Mais tarde, eu reconheço que não deveria ter dito aquilo, pois apenas adiciono mais sofrimento aos sofrimentos dos outros e isso é um erro. Eu deveria dizer a eles como lidar com o erro em vez de levantar a minha voz. Eu me esforço muito, mas é sempre difícil me controlar nesse momento de raiva

Godwin: Não só você, todos nós podemos nos relacionar com essa experiência. Você levantou uma questão prática muito importante. Eu acho que às vezes você precisa falar com firmeza para as pessoas com quem você trabalha. Antes de eu ir para o centro da meditação, eu era um bibliotecário. Então, eu tentei praticar a amorosidade com os membros de lá. Não foi fácil. As pessoas vêm tarde, pensando: Ele está praticando a amorosidade, então podemos atrasar uma hora. Ele está praticando a amorosidade, por isso não envie um pedido de licença, basta ficar em casa! Percebi que não funcionou porque algumas pessoas entendiam apenas um idioma diferente. A única coisa a fazer é ser muito claro, que agora eu vou ser firme, falar com eles com muita firmeza. Ao fazer isso não há nenhuma ferida, não há impureza interna, é apenas dizer algo que tem de ser dito.

Enfim, a segunda parte da pergunta tem um aspecto muito prático. É que quando ficamos com raiva inesperadamente, o que fazemos? A primeira sugestão é: Não se surpreenda! Porque você ainda está praticando, você não está iluminado, então não fique desapontado, não se sinta culpado, não fique bravo com você mesmo porque você ficou com raiva. Isso é muito importante. Pode acontecer aos meditantes, especialmente quando começamos a meditar, que formemos uma imagem: Eu sou um meditante agora. Estou praticando amorosidade. É assim que devo me comportar. É bom ter um ideal, mas um ideal é uma coisa, a realidade é outra.

Então, no momento em que você não teve consciência e ficou com raiva, o que você pode fazer é estar com a raiva sem se sentir mal: não há necessidade de se julgar com um ponto negativo ou de menos. Por favor, perceba isso. Isso é muito importante. Mas o que tem que ser feito é depois de se recuperar da raiva, talvez depois de cinco minutos, talvez depois de dez minutos, talvez depois de trinta minutos, não importa, mesmo que no dia seguinte, quando tiver se recuperado, então você poderá refletir sobre essa raiva. E esse tipo de reflexão tem que ser feito de uma forma muito amigável, gentil. Basta fazer a pergunta: O que realmente aconteceu comigo? Então você leva a sua mente para trás e tenta ver o incidente objetivamente, e também tenta ver os diferentes aspectos desse incidente. Assim, a nossa raiva se torna o objeto de meditação. Desta forma, nossos defeitos, nossas falhas, tornam-se experiências de aprendizagem.

O que também é importante quando praticamos dessa forma é que não temos esse medo de cometer erros. Caso contrário, ficamos tão preocupados em fazer as coisas perfeitamente, corretamente, que isso pode gerar bastante tensão, bastante sofrimento. Por favor, perceba que isso não significa ceder às nossas falhas, mas relacionar com elas de uma maneira totalmente diferente, mais significativa, mais criativa, que reduzirá nosso sofrimento e nos capacitará também a fazer o que é necessário. Então, você diz a si mesmo: agora quero ver, na próxima vez que estiver nessa situação, como eu agirei?  E apenas espere e observe. Então você está esperando por tais oportunidades para ver como você se comporta. Para explicar de outra maneira, embora você tenha ficado com raiva, não houve feridas. Então, chegamos num estado onde, quando ficamos bravos, existe menos sofrimento como resultado, e eu acho que esse é um estado muito importante.

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