Os Fundamentos da Meditação da Plena Atenção (Mindfulness)e seu lugar na saúde humana

A Meditação da Plena Atenção faz parte dos ensinamentos trazidos pelo Buddha há 2.500 anos na Índia. Nascido como príncipe Sidharta Gautama no clã dos Shakya, pequeno reino de Kapilavastu, atual Nepal, aos 28 anos viu as quatro cenas que mudariam o rumo de sua vida: a doença, a velhice, a morte e a existência de ascetas serenos. Sensibilizado por essas cenas–espelhos da realidade humana, Sidarta renuncia ao trono de seu pai e parte para a floresta em busca do método de superação do sofrimento humano. Após sete anos de práticas meditativas, libera totalmente sua mente do sofrimento, e formula a chave de todo o seu método em duas sentenças: a existência do sofrimento e a superação do sofrimento. O coração de seu método, por ele realizado, está contido nas chamadas Quatro Nobres Verdades: a existência como insatisfatoriedade-sofrimento; a causa do sofrimento; a possibilidade da extinção do sofrimento e o método prático para a extinção do sofrimento. Como um grande médico, sua descoberta envolve a constatação do sintoma, o diagnóstico, a possibilidade da cura e o medicamento (tanto curativo quanto preventivo).

Três seriam os níveis do sofrimento: o sofrimento físico do nascimento, doença,
velhice e morte; o sofrimento mental de se desejar o que não se tem, gerado e reforçado pela cobiça, e de não se querer o que se tem (as experiências dolorosas), gerado e gerando a aversão, com seus desdobramentos no ressentimento, raiva, ódio e fúria; e o sofrimento mais interior advindo da delusão, e gerado pela ignorância de não se ver a realidade das coisas como elas são. Por não vermos a realidade do corpo e da mente como eles são, desenvolvemos padrões reativos que provocam sofrimento, em suas manifestações de lamentação, tristeza, pesar, depressão, ansiedade, melancolia, ódio, estresse e tantas outras sintomáticas corporais e mentais.

Os padrões reativos da mente são condicionadores desses sintomas de sofrimento, no sentido de que eles induzem esses efeitos no corpo e na mente, e também são condicionados, no sentido de que eles são produtos de tendências anteriores, que ao encontrarem os alimentos oportunos, se aprofundam e se tornam os condicionadores de reatividades futuras. Passado-presente-futuro se encadeiam em processos repetitivos, criando hábitos e padrões de personalidade. Não teríamos algo “natural ou instintivo”, mas sim padrões de condicionamentos, processos causais. A imperatividade desses padrões é proporcional ao grau de seu enraizamento na mente humana, por sua vez dependente de uma multiplicidade de fatores dinâmicos, mas esses padrões são passíveis de serem transformados, e é aí que entra o treinamento da meditação, como parte do medicamento recondicionador da mente para padrões mais saudáveis. É curioso notar que “medicar” e “meditar” têm a mesma raiz etimológica.

Sintèticamente, a Meditação da Plena Atenção consiste no treinamento que
busca desenvolver as qualidades da concentração, plena atenção e sabedoria, de modo a tornar a mente cada vez mais atenta ao emergir desses padrões condicionadores não saudáveis, e pela não reatividade, compreensão sábia e insights, desengajar a mente dessas reatividades, enfraquecendo esses padrões, substituindo por padrões mais saudáveis, num processo gradual de libertação da mente até a total erradicação das causas do sofrimento, sinônimo do despertar e iluminação. O pressuposto íntimo desse processo é de que a mente em sua natureza última é luminosa, pura, sábia e plena, mas que, devido aos contaminantes da cobiça, ódio e ignorância, se enreda numa teia de ações do corpo, fala e mente que tendem a recriar os frutos dolorosos do sofrimento.

A tranquilização e concentração da mente (samadhi) correspondem ao treinamento de Samatha, e o cultivo da sabedoria e insight ao treinamento de Vipassana. Se pudéssemos falar de uma “anatomia” nessa perspectiva, o que denominamos de “pessoa humana” seria visto como um estado (ou melhor, processo)
existencial formado de cinco agregados: corpo/forma material, sensação, percepção, formações mentais (pensamento, memória, imaginação, etc.) e consciência. O primeiro como corpo (rupa), e os outros quatro como mentalidade (nama). Não se trata, de fato, de uma anatomia no sentido estrito usado pela nomenclatura médica, enquanto cinco partes, mas cinco ângulos com que podemos acessar à nossa experiência existencial. A ênfase está menos numa formulação de categorias-em-si, mas de suportes hábeis (upayas) para o processo de investigação dos nossos processos experienciados, pois o foco central é o conhecimento vivencial desses processos a cada momento, a mente contemplando e investigando a própria mente-corpo em fluxo, já que é nesse fluxo que reside o sofrimento, suas causas e sua superação, e por conseguinte, o campo da saúde do corpo e da mente.

–> Por Dr. Arthur Shaker Fauzi Eid – Esse é uma pequena parte de um artigo bem completo que poder ser baixado aqui: http://casadedharmaorg.org/2014/06/30/artigos-arthur-shaker/

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